Quando a poesia já não surte o efeito e a metáfora
fica vazia recorremos a outras maneiras de reconstruir a vida. A escrita é
feita com sangue, com lágrimas de dor ou alegria. As palavras são construídas
com as células perdidas em nosso ser.
Recriamos a vida, os sentimentos e as descobertas
talhando a madeira da língua pincelando a tela em branco com letras unidas,
formando enormes paisagens de sentido. A semântica é uma ciência precisa, o
texto ganha sinestesia, hipérboles e ironias, ou apenas se mantém em sua fria
objetividade.
A palavra compartilhada é viva, foge ao controle do
autor, é uma arte sem dono, sem limites, sem pudores, pois se faz faceira,
brejeira sem pedir permissão a quem lhe deu a vida. Mais que isso, palavra é
necessidade, é vício, é luta constante para quem a quer dominar. É a maneira de
exorcizar os medos, de expor a idéias, de repensar o mundo.
Escrevemos porque escrever é o que nos transforma,
poderíamos cantar ou dançar, mas apenas escrevemos. Escrevemos sobre o prazer
de ver a bailarina rodopiando na órbita do palco, sobre o prazer de ser a
bailarina que rodopia, sobre o amor que sente a bailarina pela dança. Quando
escrevemos temos apenas o limite do fim da página, mas sempre temos páginas em
branco.
O prazer de escrever é o prazer de esvaziar a mente,
o coração, de oferecer um presente à vida, algo atemporal, saber que o
sentimento será despertado, espalhado como vírus pelas folhas propagadas.
Escrevemos porque somos egoístas, queremos que o mundo sinta o que sentimos,
desejamos sentir o que o mundo sente e escrevemos todo o sentir que a mente é
capaz e que o corpo talvez não possa.
Todo escritor é na verdade uma página em branco,
escrever é o que o preenche, é sua vida, sua respiração, seu amor.